Capitalismo e
cumplicidades com o fascismo?[1]
A ascensão do fascismo nas primeiras décadas do século XX, como foi o
caso, na Europa, da Itália (1922) Alemanha (1933), Portugal (1933), Espanha (1936)
e, na Ásia, do Japão (início da década de trinta) não ocorreu num vácuo nem por
qualquer acidente de percurso, foi a resposta que as elites capitalistas dirigentes
encontraram para tornear a crise profunda que o sistema então
enfrentou.
Essa crise foi provocada por vários fatores, entre os quais se destacaram
as crises inflacionarias que se seguiram ao termo da primeira guerra mundial,
com uma economia extremamente desorganizada, escassez de bens de primeira
necessidade e desemprego maciço, ligado à desmobilização das tropas, antes
envolvidas no conflito.
Estes fenómenos económicos
e sociais – hiperinflação, escassez de bens, desemprego maciço geraram profundo
descontentamento das populações aproveitado pelos movimentos de esquerda para
desestabilizar o sistema produzindo reivindicações e agitação social. Como é
obvio, as elites capitalistas não podiam ficar indiferentes a estes
acontecimentos pois temiam não só o sucesso da revolução socialista soviética
como anteviam a possibilidade desta se estender a outras geografias. Quer dizer
todos estes fatores colaboraram no sentido de fazer tremer o sistema
capitalista e as suas elites que nesse contexto percebiam que as democracias
liberais com as suas liberdades formais e o seu estado de direito não seriam a
ferramenta adequada para lidar de forma musculada com as dificuldades sentidas.
Não por acaso os países nos quais o fascismo se implantou com mais
sucesso e força foram precisamente os grandes derrotados da primeira guerra
mundial; a paz imposta foi humilhante para os vencidos e as elites desses países bem como as classes médias temiam que a instauração de regimes socialistas, alimentada
pelo exemplo da união soviética, fosse bem-sucedida.
Mas não se pense que os países capitalistas não fascistas se distanciaram
destes, como se impunha, dado apresentarem-se como democracias liberais; bem
pelo contrário, mais ou menos abertamente mostraram, através de representantes
ilustres, se não a sua simpatia pelo menos a sua compreensão por estes regimes,
tanto antes da segunda guerra mundial como mesmo depois; lembremos, por exemplo,
que o Portugal de Salazar, declaradamente fascista, foi membro fundador
da NATO, organização que incorporou em 1949, apesar de ter sido óbvia a simpatia do salazarismo para com o
regime nazi. E isto aconteceu porque o fascismo garantia aberta e
insistentemente o seu odio ao comunismo que era também o maior temor dos países
capitalistas.
Numa outra dimensão foi o temor pelo socialismo que alimentou o estado de
bem-estar social promovido pelas democracias liberais capitalistas do pós-guerra
que tentaram prevenir conflitos e rebeliões sociais fazendo cedências
comportáveis às suas populações trabalhadoras.
Temos assim que
no decurso entre as duas Guerras o fascismo foi visto com um olhar benevolente pelas
classes dirigentes da generalidade dos países capitalistas pois afinal era um
aliado, embora incómodo, na luta contra o comunismo, que tanto temiam e
diabolizavam, como o inimigo número um a abater. Por isso, apesar de insólito,
compreende-se à luz do processo histórico a simpatia e compreensão de Churchill,
campeão da democracia liberal ocidental, por Mussolini e por Hitler, e este é
apenas um exemplo paradigmático.
Em relaçao à
segunda guerra mundial, tudo aponta no sentido de que os países ocidentais
teriam tolerado a expansão nazi alemã desde que esta se tivesse focado única e
exclusivamente nos países do leste europeu, incluindo obviamente a união soviética,
pois seria um serviço não negligenciável que esta lhes prestaria.
De modo que a
segunda guerra mundial, tal como a primeira, também revestiu a forma de um
conflito entre dois blocos capitalistas, dos quais um deles - os chamados
países do eixo - pretendia uma divisão mais equitativa do ’espaço vital’ e dos
recursos, sendo a união soviética apanhada no meio do furacão e tendo de se
aliar a um dos blocos, por uma questão de sobrevivência, para evitar a sua pura
e simples destruição. Claro que assinada a paz começou a guerra fria … com os
desenvolvimentos que se conhecem.
[1] Aconselho a leitura do artigo
“Capitalismo, fascismo e guerra “, de Jorge Cadima, in INTERNACIONAL, EDIÇÃO Nº
373 - JUL/AGO 2021, que me inspirou a escrever este texto.
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