sábado, 14 de outubro de 2023

 

Capitalismo e mercado – riscos e perplexidades

O modo capitalista de produção, centrado na propriedade privada dos meios de produção e na transformação do trabalho em mercadoria, visa o lucro como objetivo prioritário do capitalista.

Malgrado este último aspeto – lucro como objetivo prioritário - defende que o mercado, onde compradores e vendedores interagem, é o instrumento ideal para regular de modo espontâneo todo o processo produtivo; devendo para tal ser livre de interferências estranhas, nomeadamente da interferência e controlo do Estado - a liberdade do mercado é uma espécie de dogma. O pressuposto é que espontânea e livremente vendedores e compradores tomarão decisões que permitirão estabelecer de forma harmónica e equilibrada o valor de troca dos produtos apresentados, de acordo com a lei da oferta e da procura.

Segundo esta lei, o valor de troca do produto dependerá da quantidade disponível (oferta) e do maior ou menor interesse dos compradores em adquiri-lo (procura). Quer dizer, é o mercado que forma o preço e tal é defensável porque o mercado autorregula-se espontaneamente.

Através desta narrativa, que tem sido constantemente inculcada, o mercado é apresentado como uma instituição autónoma que corresponde a uma realidade universal e, sempre que se quer cercear as críticas aos rumos da economia, entra em ação. Assim, por exemplo, diz-se que o poder político não pode/deve controlar os preços dos produtos de primeira necessidade – tabelar preços – porque a resposta dos mercados a tal medida seria avassaladora. Diz-se por exemplo que o que deve condicionar a subida ou descida dos juros deve ser o funcionamento do mercado, não as necessidades das pessoas. E dizem-se muitas outras coisas …

Tudo se passa como se os mercados fossem extraterrestres e nada houvesse a fazer a não ser segui-los obedientemente, esconde-se desse modo que são em primeira e em última instância controlados por interesses de determinadas pessoas: banqueiros, grandes corporações, grandes proprietários fundiários, numa palavra, a elite económica dominante. O que se passa com o mercado no ramo dos bens de primeira necessidade, acima referido, ocorre do mesmo modo com os mercados financeiros que, sob o carimbo da autorregulação, sobem e baixam taxas de juros em conformidade com os interesses de grupos económicos e de conjunturas históricas e políticas, o que obviamente aponta no sentido da sua manipulação.

Por isso, de facto, tem de se admitir que o mercado aqui em referência não é uma realidade universal e intemporal, mas antes uma construção  histórica situada no tempo e no espaço, que se revela útil ao sistema capitalista porque, sob um nome respeitável, esconde interesses inconfessáveis. 


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