sexta-feira, 28 de abril de 2023

 

O discurso populista - estratégia e objetivos

O discurso populista (da extrema direita) - vide em Portugal o caso do CHEGA - para ganhar a adesão popular explora os sentimentos de frustração das populações atribuindo as causas do mal-estar social que estas experimentam a fatores como (1) a corrupção, (2) a existência de elites políticas bem-pensantes, mas que se estão nas tintas para o povo e (3) a entrada de emigrantes no país.

O objetivo é conquistar apoio popular que lhe permita chegar ao poder através de eleições; a estratégia é explorar a afetividade e não a razoabilidade das pessoas, fornecendo respostas simples para os problemas, respostas intuitivas que se oferecem a um pensamento imediato que não as escrutina.   

As explicações fornecidas são simples, mesmo simplistas, porque ignoram a complexidade do problema; mas são reconfortantes porque na sua simplicidade o apresentam como facilmente resolúvel; são, todavia, falsas porque não identificam as suas verdadeiras causas, mas apenas circunstâncias coadjuvantes. Perceber isto é imprescindível para uma tomada de posição consciente, mas a maioria das pessoas milita na desinformação e vota com base nessa desinformação que interessa precisamente à elite dominante, representante de facto dos interesses do capital, mas que pode sempre alegar legitimidade porque afinal foi confirmada pelo voto popular.

De facto, embora as causas que se encontram na origem das frustrações sentidas pelas pessoas estejam ligadas à corrupção, às elites politicas dirigentes e a fenómenos migratórios,  decorrem acima de tudo do modo de funcionamento do sistema económico capitalista porque é este, reparemos, que gera a corrupção, isto é, que corrompe;  é este que manipula as elites politicas para estas defenderem os interesses dos capitalistas e é este que espolia povos de outras regiões dos seus recursos naturais, de tal modo que estes se veem impossibilitados de viver nas suas próprias terras e procuram a sobrevivência em outras paragens.

Com isto quero dizer que o capitalismo consegue a proeza de mistificar a real situação que determina a vida social, isto é, consegue escamotear os fatores económicos, que são primários, para colocar os fatores políticos, que são derivados, na ribalta, levando as pessoas a pensarem que a responsabilidade pelo que corre mal é do sistema político, é dos políticos e, em última análise, da própria democracia.

Esta mistificação torna difícil reconhecer verdades incontestáveis:

·        De facto, só existe corrupção política porque os capitalistas precisam que os políticos aprovem medidas que os favoreçam, isto é, existe corrupção porque há corruptores. Logo, para eliminar a corrupção há que eliminar os corruptores – é essa a chave da questão;

·        Por outro lado, a elite política, genericamente falando, tem interesses coincidentes com os dos capitalistas pois que a democracia liberal teve desde sempre um problema de representatividade; isto é, começou por representar só os proprietários e ainda hoje são fundamentalmente os filhos da burguesia que ascendem ao poder político, não os do povo, logo está muito longe de ser uma  democracia de facto: um governo do povo, para o povo e pelo povo. Logo para eliminar este problema haveria que encontrar mecanismos que garantissem que os representantes políticos representam o povo e não tao somente os capitalistas e os seus interesses - que é o que efetivamente acontece;

·        Quanto aos emigrantes, facilmente se percebe que invocá-los para explicar os desaires que os nacionais experimentam é mero recurso à estratégia do bode expiatório, para aliviar a pressão e permitir que o ódio se dirija para estes e não para os responsáveis pela situação.

Ora enquanto o capitalismo existir e os capitalistas forem os detentores do poder económico, o qual por sua vez lhes permite dominarem o aparelho cultural, nomeadamente os órgãos de informação, a mistificação vai continuar e muito provavelmente governos populistas vão dar uma ajuda preciosa à manutenção do sistema, recorrendo, se necessário, à força e a uma ordem política que supúnhamos já superada.

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